quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
Re: Por que nerds não são populares
domingo, 8 de agosto de 2010
Para passar no vestibular - História
Primeiro de tudo,o que a gente chama de História não é apenas uma sucessão de fatos, isto é consenso entre os historiadores. Aliás, esse consenso é metade do problema: todos concordam sobre o que a História não é, mas quando a questão é o que exatamente é a História, existe pouca concordância. Espero que você entenda a diferença.
A outra parte do problema é que nossa meta aqui é a preparação para um concurso público. O objetivo do concurso é selecionar os mais qualificados, baseado em critérios objetivos. Em um Estado democrático de direito, a banca do concurso deve respeitar nossa liberdade de opinião. Isso significa que a banca não pode considerar uma opinião certa ou errada. Se a resposta é X, mas o assunto admite uma segunda opinião, a questão tem que ser anulada. Por isso, as respostas têm que ser baseadas em critérios objetivos, ou seja, elas precisam ser comprováveis com base em dados concretos (materiais) e através do raciocínio lógico.
O que forma a objetividade de um tema não é o que diz o povo nas ruas, mas o que dizem os especialistas, de preferência os reconhecidos institucionalmente (os diplomados). E como, mesmo entre os especialistas, há muitas opiniões diferentes sobre um mesmo assunto, a questão da prova não pode dar muita margem a interpretação – porque o candidato tem liberdade de opinião, que lhe dá o direito de concordar com tal ou qual interpretação. Na verdade, não sendo especialista em História, o candidato nem tem obrigação de conhecer todas as vertentes interpretativas sobre o assunto. Por isso, a banca só pode cobrar na prova aquilo que é consenso entre os historiadores: ou seja, o que não é história.
Em outras palavras, os especialistas concordam que a História é mais do que decorar datas e fatos, que a História é uma interpretação sobre datas e fatos, mas como as interpretações são divergentes, a nossa única informação segura são datas e fatos. E algumas poucas interpretações que são consenso entre os especialistas.
São muitas datas, muitos fatos, numa realidade extremamente complexa. Para simplificar, tentamos fazer com que sigam um encadeamento lógico. Do tipo: “três fatores que provocaram o fato tal”, “três conseqüências do fato tal”.
Todos criticam a História decoreba, aquela em que você precisa decorar uma sucessão de datas e fatos. Nós historiadores a chamamos de História tradicional, ou de História positivista. Muito diferente da História dos historiadores. Mas o que cai no vestibular é justamente esta História tradicional, apenas um pouquinho melhorada. Em lugar de decorar os nomes e datas da História tradicional, precisamos conhecer os processos sociais, dos quais os fatos parecem conseqüência lógica e necessária.
Por exemplo, em vez de ensinar que Luís XVI demitiu Necker e precipitou uma rebelião popular na França em 1789, preferimos dizer que a economia francesa estava em crise, o que precipitou uma rebelião popular na França, em 1789. Na verdade, nenhum dos dois fatos tem mais valor explicativo do que o outro, depende apenas do ponto de vista de quem explica. Mas pelas características do concurso, preferimos a segunda explicação, por ser mais generalizante.
Como então decorar este monte de coisas? Agrupando-as. Assim, fica um número menor de informações para se trabalhar. Depois, você vai esmiuçando cada grupo, se embrenhando pela hierarquia dos temas, até que um assunto te leve a outro próximo. Pegando um de cada vez, fica mais fácil memorizar.
Por fim, existem duas categorias de “coisas” que é preciso saber: fatos e conceitos. Na minha opinião, os conceitos são mais agradáveis de se estudar, porque são mais abstratos e aplicáveis a diferentes situações. Dão à História uma aparência lógica, deixam-na fácil de entender. Mas é preciso ter em mente que os conceitos são construídos com base em fatos. Se não conhecemos os fatos, nossos conceitos não têm nenhum valor. E o conhecimento de novos fatos nos permite contestar os conceitos, pô-los à prova e aprimorá-los.
Portanto, atenham-se ao que a História tem de objetivo. Há certos temas que são apaixonantes, outros são revoltantes, muitos, intrigantes, mas não há espaço em uma prova de “marcar xis” para debater estes assuntos.
domingo, 26 de abril de 2009
A crase
Muito desta dificuldade atribuo ao que chamo de Português apostilesco, ensinado em nossas escolas -- um estilo voltado à resolução de provas, que ao abordar o assunto enfatiza macetes e "pegadinhas", e se esquece de consolidar o conceito. O aluno, ou o ex-aluno que carrega esta lacuna em sua formação, deve se esforçar em escrever corretamente no dia-a-dia, e rapidamente verá como a crase "sai" naturalmente. Vamos a ela.
Para começar, eu diria que a crase não é um fenômeno da escrita, mas do pensamento que antecede a escrita, e que se manifesta no papel sob a forma de acento grave.
Chama-se crase a junção de duas letras -a. Arbitrou-se em nossa língua não escrever vogais dobradas, por isso não existem palavras com aa. Quando isto acontece, a união dos dois -a é indicada pelo acento grave (`), cuja única função em português, atualmente, é indicar a ocorrência de crase.
Antigamente, além da crase, o acento grave era usado para indicar que havia um acento agudo no radical de palavras derivadas que tivessem a sílaba tônica deslocada por um sufixo. Por exemplo, em "obviamente", a sílaba tônica é -men-, mas como na palavra original, "óbvio", o acento está no primeiro -o, escrevia-se "òbiviamente". A crase, por sua vez, é a união de duas vogais. Falando tecnicamente, portanto, o erro que se comete não é "no emprego da crase", mas no emprego do acento. A pessoa viu crase onde não tinha, e empregou o acento grave erroneamente.
Pois bem, a crase pode ocorrer em dois casos:
1º- Quando a preposição "a" antecede o artigo definido "a". Daí, escreve-se "à" (ou "às"). É o feminino de "ao".
2º- Quando a preposição "a" antecede a palavra "aquele" (pronome demonstrativo), ou uma de suas variações. O pronome contrai a preposição, e fica "àquele", "àquela", etc.
Nunca vi nem ouvi falar nada a respeito de uma possível alteração de pronúncia causada pela colocação do acento grave sobre uma vogal. Não é como o acento agudo, que transforma "e" em "é", "o" em "ó", e daí por diante. Poder-se-ia falar com uma voz mais grave, para fazer juz ao nome do diacrítico, mas eu, particularmente, sinto-me tentado a pronunciar "aa" quando leio um "à". Vejo algumas pessoas fazendo o mesmo, mas por puro idealismo, já que não há convenção formal a respeito. Em outras palavras, o erro no "emprego da crase" só se comete por escrito.
É necessária alguma prática na identificação das classes gramaticais para saber quando ocorre a crase - e daí empregar o acento grave apropriadamente.
É fácil saber quando aparece a preposição "a" em uma frase. Em geral, ela segue os verbos que rege, e é praticamente impossível usar um verbo com a preposição errada, uma vez que isto tira, ou muda radicalmente, o sentido do que se quer dizer.
Tomemos o verbo dar: você dá algo a alguém. "João deu o anel a Júlia". Se trocarmos a preposição, a frase muda de sentido: "João deu o anel de Júlia". Mudou o sentido da frase, e agora Júlia está puta com João. Júlia antes era núcleo do objeto indireto; virou complemento nominal do anel. Tem razão de não ter gostado.
Portanto, vimos como é fácil identificar o "a" preposição.
Quanto ao pronome demonstrativo, só um idiota não perceberia que há dois -a seguidos numa frase como "No fim de semana, fui a aquela praia." Ora, não se escreve "a aquela", mas "àquela". O resultado é "No fim de semana, fui àquela praia". Simples.
Então, afinal, qual a dificuldade no emprego do acento grave?
O problema reside no artigo definido. O artigo, não podendo ser núcleo de nada, cumpre sempre a função de adjunto adnominal. Sendo adjunto, não pode ser obrigatório. Porém, há situações em que o costume exige o emprego do artigo definido.
Nas aulas de Português apostilesco, reserva-se uma unidade inteira ao assunto "quando o 'uso da crase' é obrigatório" (o que vimos não ser lá muito correto, porque crase não se usa, ela simplesmente ''acontece''). Na realidade, o tema deste capítulo deveria ser "quando o artigo definido é indispensável." Ao deparar-se com a preposição "a", e sabendo se o artigo é indispensável, opcional, ou proibido, automaticamente se descobre se o acento grave será obrigatório, facultativo ou errôneo. Para concluir, vejamos alguns casos:
Sabemos que o artigo "a" somente define substantivos femininos. Portanto, nunca teremos crase antes de nome masculino. Dar qualquer coisa à João é errado. João é do gênero masculino, por isso só se pode dar as coisas a João.
Outro erro comum é "à ele". Erro duplo, porque ele é masculino, e porque não cabe artigo definindo um pronome pessoal -- ninguém diz "O ele está com fome." Da mesma forma, "Dizer à ela que isso e aquilo" não convém, porque se está colocando artigo onde não deve.
Substantivos próprios nunca são antecedidos por artigo. Por isso, seria errado "João deu o anel à Júlia", assim como o seria "Júlia devolveu o anel ao João". É um erro muito comum na fala de várias partes do Brasil, que induz ao erro na escrita.
Alguns nomes de lugares são precedidos pelo artigo, obrigando a crase, outros não. Veja os casos de Paris e França (faça você mesmo!).
Nas locuções adverbiais de tempo, mais especificamente, ao expressarem-se as horas, o acento grave nem sempre é obrigatório, veja: "Encontramo-nos às duas da tarde." -- "O encontro foi marcado para as duas da tarde." No segundo caso, a locução foi introduzida pela preposição "para", portanto só sobrou o -a do artigo. Repare neste último caso que, sem o artigo, a frase soaria estranha. E este é sempre o melhor indicador: se soar estranho sem o artigo, muito provavelmente este é indispensável.
Em breve posto uns exercícios sobre o assunto, prometo.